terça-feira, 30 de setembro de 2008

Cálice (trecho)

Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade
Mesmo calado o peito, resta a cuca
Dos bêbados do centro da cidade


Chico Buarque

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

"Onde Azevedo Amaral nos parece lamentavelmente exagerado é em considerar todos aqueles povoadores [...] uns 'tarados, criminosos e semiloucos'. [...] A ermos tão mal povoados, salpicados, apenas, de gente branca, convinham aqui superexcitados sexuais que aqui exercessem uma atividade genésica acima da comum, proveitosa talvez, nos seus resultados, aos interesses políticos de Portugal no Brasil.
Atraídos pela possibilidade de uma vida livre, inteiramente solta, no meio de muita mulher nua, aqui se estabeleceram por gosto ou vontade própria muitos europeus do tipo que Paulo Prado retrata em traços de forte realismo. Garanhões desbragados."


Trecho cômico de 'Casa grande e senzala', de Gilberto Freire
é provável que pertençamos a uma época de crítica em que a ausência de uma filosofia primeira a cada instante nos lembra o reino e a fatalidade: época da inteligência que nos mantém irremediavelmente à distância de uma linguagem originária. Para Kant, a possibilidade e a necessidade de uma crítica estavam ligadas, através de certos conteúdos científicos, ao fato de que existe conhecimento. em nossos dias, elas estão vinculadas - Nietzsche, o filólogo, é testemunha - ao fato de que existe linguagem e de que, nas inúmeras palavras pronunciadas pelos homens - sejam elas racionais ou insensatas, demonstrativas ou poéticas - um sentido que nos domina tomou corpo, conduz nossa cegueira, mas espera, na obscuridade, nossa tomada de consciência, para vir à luz e pôr-se a falar. Estamos hitoricamente consagrados à história, à paciente construção de discursos, à tarefa de ouvir o que já foi dito.

Michel Foucault, em 'Nascimento da clínica'

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Enivrez-vous

Enivrez-Vous. Il faut être toujours ivre. Tout est là: c'est l'unique question. Pour ne pas sentir l'horrible fardeau du Temps qui brise vos épaules et vous penche vers la terre, il faut vous enivrer sans trêve. Mais de quoi? De vin, de poésie, ou de vertu, à votre guise. Mais enivrez-vous.
Et si quelquefois, sur les marches d'un palais, sur l'herbe verte d'un fossé, dans la solitude morne de votre chambre, vous vous réveillez, l'ivresse déjà diminuée ou disparue, demandez au vent, à la vague, à l'étoile, à l'oiseau, à l'horloge, à tout ce qui fuit, à tout ce qui gémit, à tout ce qui roule, à tout ce qui chante, à tout ce qui parle, demandez quelle heure il est;
et le vent, la vague, l'étoile, l'oiseau, l'horloge,vous répondront: "Il est l'heure de s'enivrer! Pour n'être pas les esclaves martyrisés du Temps, enivrez-vous; enivrez-vous sans cesse! De vin, de poésie ou de vertu, à votre guise.

Charles Baudelaire