segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Insônia

o galo do vizinho e o trem a uns dois quilometros pareciam manter uma conversa desvairada e intensa. o cantar do primeiro era intercalado pela buzina do segundo, e no fundo percebia-se que aquilo era somente uma grande sacanagem com quem dormia um sono superficial nas cercanias. os cachorros pareciam entrar na brincadeira, e quando o papo entre o galo e a maquina escrota e barulhenta parecia dar tregua, os cãe da vizinhança retomavam esta guerra de sons de intensidades e qualidades irritantes a cada minuto que se passava na madrugada.
o céu nao colaborava muito com os que lutavam contra a insônia, guardando em si uma lua minguada com estrelas apagadas entre nuvens extremamente baixas e rápidas. era uma madrugada monótona que só tinha a irritar quem quisesse tirar algum entretenimento dali.
essa cidade sempre foi assim: todos os dias parecendo terças-feiras e a maior parte do dia parecendo manhãs de sábado. no conjunto:terça-feira; retalhado: manhãs de sabado. não importava o ano, estação ou época do ano, os dias não conseguiam se diferenciar de outro, coisa que trazia grande marasmo pra quem ali conseguia sobreviver.
já sobre as noites não se poderia falar o mesmo. as noites eram como são em qualquer parte: muito profundas e inperscrutaveis. entretanto esta em especial não trazia nenhum atrativo ou curiosidade para amenizar as mentes exasperadas acordadas por forças que eles mesmos, os donos delas(que em muitasd ocasiões poderiam ser chamados de escravos delas), não podiam explicar da onde vinham.
os motivos, com certeza, eram variados, bem sortidos num saco grande de desilusões e segredos escondidos dos próprios confidentes. mas como dito, nada consciente e nada aparente, só o desconforto.
alguns teriam dito que o suicídio era uma opção àquela circunstância, não pelo desespero ou pela angústia, mas justamente pelo contrário, pelo vazio imenso de uma mente que escondia muito bem todos suas sujeiras para debaixo do tapete. uma bala de calibre qualquer, tanto faz, encontraria somente a resistência de duas paredes: a da entrada e a da saída.
outros afirmariam que nada se passava de errado se algum familiar o surpreendesse em sua vigília, e em segredo(mais um) forçaria que seu sono aparecesse o mais rápido possivel, e até ameaçaria o coitado de porrada caso nao cumprisse com sua ordem de vir ligeiro.
outros ainda prometeriam a si mesmos que no dia seguinte - caso ele existisse(coisa que se põe em duvida devido a quase inexistência de uma noite de sono que pudesse separar dois dias)- seus demônios que os acompanhavam noite após noite, fossem eles quem fossem, seriam encarados de uma forma ou de outra, ou os ameaçando de porrada (como a turma anterior ameaçaria seu sono) ou de forma heróica, mas humilhante, assumiriam seus defeitos e falhas e encarariam triunfantemente sua pena.
mas nada disso, na verdade acontecerá. sejamos sinceros. nesse lugar, no meio do país da indiferença, em que nada mudou desde onde a memória alcança, no lugar onde os mais velhos guardam ainda no peito remorsos e arrependimentos acontecidos na sua adolescencia, nada, nunca nada ia ser diferente. pelo menos diria isso a mente mais racional. e menos indicado para o serviço.

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