segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Acontece, às vezes, de desaparecer a personalidade, e a objetividade, que é própria aos poetas panteístas, desenvolve-se de modo tão anormal que a contemplação dos objetos externos faz com que você esqueça a sua própria existência e confunda-se em seguida com eles. Seu olhar se fixa em uma árvore harmoniosa curvada ao vento. Em alguns segundos, o que seria para o cérebro de um poeta uma comparação bastante natural torna-se realidade para o seu. Primeiramente, você empresta à árvore as suas paixões, seus desejos ou sua melancolia; os gemidos e as oscilações tornam-se seus e, logo, você é a árvore. Da mesma forma, o pássaro que plana no fundo do céu representainicialmente o imortal anseio de planar acima das coisas humanas; mas eis que você é o próprio pássaro. Eu o imagino sentado e fumando. Sua atenção repousará longamente sobre as nuvens azuladas que exalam de seu cachimbo. A idéia de uma evaporação, lenta, sucessiva, eterna, tomará conta de seu espírito, e você aplicará em seguida esta idéia aos seus próprios pensamentos, à sua matéria pensante. Por um estranho equívoco, por uma espécie de transposição ou de quiproquó intelectual, você se sentirá evaporando, e atribuirá ao seu cachimbo (no qual você vai se sentir curvado e encolhido como o tabaco) a estranha faculdade de fumá-lo.


Baudelaire, em "O teatro de Serafim".

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